Quarta-feira, 17 de Junho de 2009

Se eu tivesse uma mesa no escritório, agora eu estaria retirando porta-retratos e limpando a área.

Se eu morasse com ele, estaria agora cobrando o 'neruda que você me tomou e nunca leu'. Ou 'passando com o portão sem fazer alarde, com a leve impressão de que já vou tarde, e levando no peito saudade'.

 

Se eu tivesse mais vergonha na cara, eu não estaria dizendo isso aqui. Eu sei. Mas, no fim das contas, a vida é sempre mesmo tão previsível. A gente é sempre tão previsível.

Agora a banda toca de outro jeito, tô tentando entender, tô tentando me acostumar, tô tentando assimilar: quando eu quiser muito pegar na mão de alguém pra não me sentir sozinha, eu já não poderei pegar na tua, terei de procurar a tua mão. quando eu tiver uma cantada de pedreiro ótima pra contar, eu já não poderei discar no seu número as gargalhadas, terei de procurar outro ouvinte. quando eu quiser te dar um beijo, eu já não mais vou poder te dar, ficarei na vontade. quando eu quiser dar uma lavada no stop em alguém, você já não será mais a vítima, eu não posso ganhar sem ter quem perca. agora quando eu quiser ficar sete horas no telefone, já não vai ser o seu estudo que eu vou atrapalhar. agora quando eu inventar apelidos doidos, nenhum caberá mais em você. agora quando eu descobrir que os seus artistas favoritos estão gravando músicas, eu não vou mais te avisar. agora quando chegarem cartas pelo correio, não mais serão de você pra mim. agora quando meu celular vibrar, não haverá nenhuma chance de ser mensagem tua. agora eu não vou mais contar os dias pra te ver, ficar feliz só de te ver. quando você me encontrar agora, será casualmente e você não vai mais tocar no meu rosto pra eterniza-lo na sua memória. o seu número que eu sei mais do que de cór, vou ter que esquecer. a sua janelinha no meu msn não será mais a favorita. quando aconter algo horroroso ou maravilhoso na minha vida, eu vou precisar tomar cuidado pra não sair correndo pra te contar. quando for o seu aniversário, eu não vou estar de chapeuzinho cônico na festa. eu nunca mais vou ter que mendigar pra você pelo-amor-de-Deus me acompanhar até alguma festa. eu nunca mais vou ser empurrada pra fora da cama na hora de dormir. não tem mais 'minha linda', nem gerbera, nem MAM as terças-feiras, nem sogra. não tem mais comemoração todo dia sete, não tem mais poesia despida no ouvido, não tem mais nossos códigos, não tem mais nada. não tem mais te ter, não tem mais contar com você, não tem mais você como figura central e importante que dá sentido as coisas e pros braços de quem eu corro pra dentro. não tem mais nós. ficamos a sós.

 

Já disse, sabia e certamente, Lenine, mesmo quando o mundo pede um pouco mais de calma e até quando o corpo pede um pouco mais de alma, a vida não para. Fácil, não é. Desenlaçar duas vidas é sempre processo - mas de toda guerra, saem sobreviventes. Porque não sobreviver ao próprio processo?! Deixar a dor correr, ok. Prolongar a dor com coisas que só vão trazer mais dor, não, obrigada.

 

Agora, eu tenho que ir, com meu corpo, calma e alma. Que a vida não para mesmo. E eu tenho que apresentar um seminário.

 

[a saudade é um filme sem cor

que o coração insiste em ver colorido ~ ]

 

 



publicado por Juliana Correia às 10:34 | link do post | comentar | favorito

1 comentário:
De Lari Dantas a 17 de Junho de 2009 às 18:09
Bê,

adoro ler os seus desabafos e me cativar por todo sentimento que você sabe colocar em palavras lindas.
Pode não ser assim que a banda toque mais, mas essa banda pode tocar de outras formas, de maneiras mais belas, pra retomar a harmonia dos instrumentos.

te amo.


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