Estou indo até o fim com você. Quero ser diferente das mulheres que passaram pela tua vida e passaram. Quero estar passando. Sei que você gosta (ou não?) desses meus bilhetes na tua carteira, no teu pára-brisas grudadinho, no espelho do teu banheiro...
Eu tenho é que estar presente, me fazer presente, sabe? Pois é assim que sei escrever e ler histórias, com personagens e suas possibilidades de presença e ausência (simbólicas e reais!) Mas eu, eu quero estar com você, estar em você, fazendo parte de você e do seu jeito de ver tudo isso, não como um parasita que te suga, mas como uma prova da evolução darwinista, um preparo para o que o mundo exige para a preservação tua...
Eu amo o seu silêncio que grita brutalmente em confronto em confronto direto com a minha proliferação de palavras (inúteis, em absoluto) e odeio o seu silêncio que me impede de te conhecer a fundo, de entrar em contato. (E nada supera o amor do que amar o que irrita no amado e se irritar com o que se ama - lembre-se disso sempre, guarde como amuleto para todas as horas).
Eu amo esse teu jeito de me observar, parecendo um lince na savana, absorto em observação, esperando o espaço/tempo de dar o bote, com ambição e força, como quem deseja e necessita saciar a fome na carne do pobre cervo (que sou eu) que pasta despretensiosamente e distraído na relva, pastando pelo campo (numa clara metáfora de "caminhando pela vida") esperando algo acontecer, não sabendo exatamente o quê - e aí acontece, você se projeta em silêncio e me ataca até a alma, carne, sangue, seu, meu, nosso, tudo e não diz nada, ao mesmo tempo que diz: acredita.
Depois a gente dorme, acorda, vai pro trabalho, almoça, volta e você segue sempre me achando, em mosaico de vitral (transparente e refletivo), aos pedaços pela casa, em bilhetes de poesia, em lembretes de compromissos ou em cartas que começam do nada e terminam em lugar nenhum (você sabe né?) - pois tudo isso sou eu, sou todas estas mulheres, a real, a prolixa, a quente, a racional, a amorosa, a lúcida, a carente...a tua, sempre a tua. A que te ama dormindo como uma criança (no sofá, de óculos, por cima do jornal), a que te admira enquanto você tenta objetivar o abstrato, a que te diz o que ninguém te diz de um jeito que mais ninguém sabe dizer, a que não sabe te seduzir...
E nós vamos sendo sem ser, dançando sem música, falando de menos ou amenidades demais, tomando mais vinho do que deveríamos, e nos comprossimamos e comprometemos em questões úteis e intelectuais de trabalhos emergentes para que só possamos nos amar no supérfluo - que é o melhor tipo de amor que há pra se compartilhar, o amor da preguiça matinal, do sexo corrido e carnal, do cinema no domingo, da discussão sobe o preço do arroz ou a corrupção, das idéias do que fazer com o orçamento doméstico, de regar as plantas, do beijo acostumado e do baralho na varanda - e não fazer deste amor a razão da nossa existência.
Trabalhamos em tudo, menos em nós juntos, o nosso romance está na entrelinha de um parágrafo chato no meio do texto (aquele que ninguém lê), poderíamos ser um livro cômico, uma peça dramática ou um filme de terror.. dependendo da hora, do assunto, do contexto...
Enfim, boa aula de doutorado querido. O jantar te espera no forno.
Rafaela.
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