"- O que você faria no meu lugar?"
Era enfim ali o momento que a pergunta caia. Eu já vinha esperando por ela, por conhecer sua notória previsibilidade, afinal, eu também passara vários anos sentada no divã procurando minhas próprias respostas. Respeitei a pergunta e achei até natural - não é natural a ansiedade de querer saber o que os outros fariam em nosso lugar? se vêem soluções e nuances que desconhecemos? se quem tanto nos ouve, saberia solucioná-los? não seria também quase uma provocação, como quem diz "o que mais eu poderia fazer então, dr. sabichão?" não seria essencialmente um pedido por uma chance de reavaliarmos o que estamos fazendo, se podemos fazer melhor, um abrir de olhos para ângulos novos? Por outro lado, o perigo da pergunta é a ilusão. A ilusão de passar as escolhas para outro fazer em seu lugar e a ilusão eminente de encarar qualquer resposta como uma receita mágica que deve ser seguida passo a passo ao pé da letra. Ambas são perigosas - para uma terapia bem sucedida é necessária a compreensão do indivíduo como mentor de sua vida, responsável por suas escolhas, seus caminhos e as consequências e renúncias envolvidas.
Ao considerar todas as vertentes, resolvi ser criteriosa, porém sincera:
- Ao me perguntar isso Ana, você espera que eu lhe diga o que eu faria na sua posição, o que eu faria se a situação acontecesse na minha vida ou que eu ofereça uma solução confortável e palpável para o incidente? Porque, não tenho soluções nem respostas prontas e, na minha opinião pessoal, não sei se elas são possíveis senão construídas...e tampouco me sinto apta a pensar no que faria em seu lugar, tivemos histórias, criações e transmissões de valores diferentes, portanto nossos olhos não podem nem sequer contextualizar o acontecido da mesma forma...
-Não Patrícia, eu queria mesmo era saber como você lidaria com isso na sua vida...como se isso tirasse você do pedestal de terapeuta e trouxesse para a natural possibilidade de crise...
Ana tinha problemas extremos em expressar confiança nos relacionamentos e por isso tinha começado a terapia. Agora seu noivo a tinha deixado e ela se sentia mais insegura e desconfortável do que nunca. Achei que poderia ser saudável respondê-la com sinceridade e resolvi arriscar, mesmo que a fragilidade pudesse desencadear uma infinidade de respostas, certamente poderíamos elaborar como ela se sentia perante minha confissão, o que ela andava fazendo realmente por si e nosso relacionamento a partir disto.
- Se isto acontecesse comigo Ana, penso que eu faria o que costumo fazer nas horas díficeis. Mergulharia no autoconhecimento, intensificaria a terapia, me daria mais horas para fazer coisas que eu gosto e me relaxam, buscaria arduamente a espiritualidade, respeitaria minha solidão e procuraria priorizar os poucos amigos que sei que gostam de mim como for e como sou, mesmo que eu repita a mesma história incontáveis vezes, que eu fique insegura e pessimista e queira contagia-los, que só chore e nem sequer faça algum sentido ou que insista em idéias absurdas - saber que ainda assim alguém é capaz de ter afeto sincero por mim é extremamente reconfortante e encorajador. Ainda mais quando alguém me deixa...E você Ana, como se sente perante tudo isso que eu falei? Como se sente por eu ter confiado a você algo tão particular meu? O que você tem feito para superar, para se cuidar? O que você pode fazer por você?"
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