Nanda se olhava, ali, com a maquiagem toda borrada. As sandálias viradas de qualquer maneira no chão, o vestido lindo ajustado ao corpo, o cabelo secado durantes horas afim de parecer natural. Nada mais parecia encaixado. Tudo era fiapo, inclusive ela, que se arrastava na parede gelada procurando explicações. Para que tudo aquilo?De frente para o grande espelho na porta, ala já não sabia. Estava cansada. Cansada de suas falsas expectativas, de seus desejos irrealizaveis, das suas desilusões. Ela não entendia e pronto. Qual era o sentido de convida-la para ir ao baile - e ficar com outra? Porque os homens, ou pelo menos os homens que ela escolhia, faziam coisas que não pareciam ter lógica? Será que eles sabiam que desde que ela se entendia por gente, era ali, na frente daquele espelho, que ela chorava? Tirou o vestido. Para que ser a princesa, se os principes sempre preferem as mais fáceis? Encostou no chão e olhou bem para si. Não queria ter pena de si mesma e lembrou. Lembrou do seu primeiro amor, quatorze anos e sonhos. Ele foi embora para outro estado. Até hoje se falavam. Ela chorou muito abraçada ao seu urso na frente daquele espelho. Compreendendo que o amor correspondido nem sempre é a plenitude da manutenção - existem sempre os percalçõs do caminho. A cada fim de namoro ela se encerrava ali, de frente pro espelho, tentando encontrar, tentando enxergar nela os sinais, do último beijo, do último sorriso entre as lágrimas. Ela estava cansada de ver os meninos brincarem com seus sentimentos. Para que dizem "saudade" se não a sentem? Para que insinuam que gostam se tratam uma simples ligação fofa como uma algema de casamento? Ela não queria mais ficar se vendo daquele jeito no espelho, no seu espelho, no seu reflexo, dentro de si. Levantou enérgica, ligou para as amigas, aquelas que sempre sabem o que dizer, que sempre tem os amigos mais legais e as maiores dicas de maquiagem. Se rearrumou, pegou com rapidez as sandalias e as calçou. Não pôde evitar o espelho. Ele a acompanhou durante toda a sua trajetória de patinho feio, de inseguranças,medos e foras. Mas se olhando agora, ela se sentia viva, mulher e dona de si. Ela sabia o que queria - e o que não queria. (Nada mais de ser a outra, de ligações de última hora, de ser a segunda opção e de esperar mensagens que nunca chegavam). Ela olhou bem o reflexo, e pela primeira vez se enxergou inteira. Gostou do que viu. Se entendeu e se amou. Ela queria ser feliz - e seria. Pegou um cinzeiro e arremessou no espelho, quebrando-o em diversos pedacinhos com estrondo. Olhou os pedaços espalhados pelo quarto e se enxergou um pouco em cada um deles. Ali ela compreendeu tudo. Tudo fez sentido. Ela era a conjunção das suas experiências sim, e cada vidro no chão refletia isso, lembrava isso, mas, mais do que isso,ela era o que ela fazia com suas experiências. E ali, naquele momento,ela tinha escolhido ser feliz e deixar o passado para trás. Era muito mais fácil encarar o espelho e a vida assim, em pedaços, do que aquela monstruosidade que parecia lhe engolir, que lhe mostrava detalhes que ela não precisava ver, de cara, na imensidão de relfexos assustados. Em um vidrinho, ela se viu sorrindo,e aquilo também era, afinal, parte dela.. Deixou todos os vidros lá, embaralhados pelo chão, formando o seu quebra cabeças pessoal. Fez um coque e saiu.
"Não sou aquilo que fizeram de mim
Sou aquilo que faço com o que fizeram de mim"
Sartre.
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